terça-feira, 21 de dezembro de 2010

Navegar

Lasciva e determinada, me agarra
É ódio / iniquidade/ meio / fim
Impregnada -----------------------
A embarcação balança e cai ao mar
E eu já não sinto tanto a sua falta
Envolta à serpentes de botes
Encaixa-se à despedida da sua última marionete
É cinza esse mar, é jocoso
_

Vários nós indestrutíveis são formados novamente
                                                            Em ponta de faca]
Como daquela outra vez em que disseste
Para eu não perecer
Por entre a floresta de algas, lhe transfiro o mundo
Já tão mutilado, multilateral
Todas as oferendas gastas com o tempo,
Arremessadas na borda da praia, mergulham
E tornam-se escravas da corrente
Em teu luxuoso colo quero descansar
Antes de me atirar à náufrago
Hoje me faço otimista pelo único prazer de habitar teu céu,
Beber tuas lágrimas

Tá decidido! Serpenteio de volta à superfície,
Minhas rosas chegam até você
Tô fraco.

terça-feira, 7 de dezembro de 2010

Desancorar O Barco

Demais, já estive preso em jaulas de outros compartimentos
Mas sou menor que sinto o que o vento pressente, sem desmentir que é real
Foi em berços de outros vagões que eu fui me dá por vencido, em trilhos
E detestáveis anomalias que o tesouro oferece ao passante, que está prestes a
Entrar em estado de choque, tamanha a violência das ondas
Mesmo que a tempestade seja atroz, as velas vão conter os redemoinhos
Porque hoje foi o último dia, daqui pra frente nada se sabe
Clarividência seria bem-vinda, mesmo que depois eu volte a ser inepto
Até aí, tudo bem. ----------------------------------------------------
A gente desfaz o que ainda não foi feito, tentamos despistar o acaso
De um jeito ou de outro ele sempre vai nos surpreender
Mesmo que cheio de acrobacias, passe a se tornar hipotético
Essa é a cor que ainda não molhou os pincéis dos grandes artistas plásticos
Tem o nome e o sabor facilmente reconhecíveis após o adeus
À Deus: tudo o que há de bônus
Preencher os espaços vazios com samba de natureza encharcada

Difícil é encontrar esse gosto de sal de novo
Mesmo que o sol venha a nascer do mesmo jeito de ontem
Será diferente demais, como se o século desse um pulo à frente
E eu só tenho um medo: Achar-me.

quinta-feira, 25 de novembro de 2010

Conectado

Assim que eu abri os olhos, por volta das 3 da manhã,
senti que o relógio me impulsionava a fincar meus pés no chão.
Sonhava que tinha umas luzes me guiando a colonizar um lugar inóspito,
perto da Coréia do Sul, próximo à caatinga. Ia ser um trabalho difícil.

Finquei os pés no chão. Os sentimentos se afloravam.

E então eu me via n'outro sonho. Sonhava que estava num show e as luzes
me guiavam à freneticidade corporal, coisa que não é muito peculiar a mim,
nem ao meu outro eu.

Finquei os pés no show, digo, no chão.

Olhei pela janela e vi raiar um pedaço de dia, início da manhã,
o sol apostando corrida com as nuvens.
Pro lado esquerdo, se olhasse, dava pra ver um pedaço de estrada, de asfalto,
indícios de que carros passariam por ali mais tarde, digo, mais cedo.
Perambulei um pouco pela casa, abri a geladeira, tomei um gole daquele
líquido gelado e pensei em minha mãe. Ela logo ia chegar. Logo logo
estaria em casa, tava viajando a senhora. Saiu pra respirar outros ares,
coisa que eu faço pouco. Me senti como num início de um acesso
de ansiosidade. Não consigo comer ansioso, nervoso, nada, nem nadar,
comer, nervoso, ansioso. Minha mãe uma vez me falou:

- Você precisa ficar antenado para o futuro, presente e passado,
não necessariamente nessa ordem, ao mesmo tempo em que come chocolate
e fica bolando meios para que o despertador te acorde de manhã cedo,
no horário que quer.

Pensei que poderia ser pior: eu poderia
estar escovando os dentes com os dedos.
Senti que o poder estava em minhas mãos. Cheguei à conclusão
de que eu deveria me sentir assim sempre.
Sonhei que dormia. Eu me vi dormindo, sonhando, me vendo
nos meu próprios sonhos. Me vendi, me assisti.
Meu pai uma vez me lembrou:

- Sua mãe uma vez te disse que você deveria ficar sempre antenado para
o futuro, presente e passado, não necessariamente nessa ordem.

- Mas eu é quem faço a ordem, você faz a ordem, todos nós fazemos a ordem.

- Aí a ordem se cria por si só. Como? Impossível!

Se tornaram meio contraditórios os caminhos que eu tomei.
Nenhum deles se encontrava. Fiz cara de emotion.
Sonhei que despencava, mas antes d'eu fincar meus pés no chão,
eu acordava e meu sonho se tornava realidade.

terça-feira, 16 de novembro de 2010

Répteis do Submundo

Ela finge ousar de tanta beleza, cura ou dor
E naqueles momentos em que a madrugada consome
Passa o tempo, sua felicidade se prende ao passo em
que sua sede é saciada em troca de um favor

Foi despejando sons pelos quais eu a reconheci tocar
Pobre instrumento de calda que o Diabo amassou
A cortina que balançava realizava o trabalho em alusão a um perito,
Um especialista em trânsito sanguíneo, analisando
E perscrutando o cadáver que emitia sons legítimos
Em tom de palmeiras balançadas pelo vento
Ninguém pensa nas mazelas ou no crime mais doloroso
Tudo isso ocupa um lugar inexistente no vazio do ser
E todo o espaço que outrora estava ocupado por inércia,
Agora se torna música, discorrendo em mágica

O biscoito de chocolate não fala, que besteira
Não tem olho nem ouvido, divide o prazer de ser
Devorado por nós, na cama, na rua, por baixo dos lençóis
Ou em filas de banco
Aí você para-brisa
Vamos desprezar o rancor,
Vamos fazer aviões de papel,
Pintar o muro com as próprias mãos, soltar pipa
A temperatura - inesperadamente - varia
Fervilha seus miolos como se fosse uma lareira dentro de você
Mas se por acaso vier me fazer birra, saiba que eu encurralei
Todas essas tentações
Foi pura resistência inicial, impossível de ser lavada
De ser tocada
Pois derreteu-se e daqui a pouco são só cinzas, jogadas ao mar

Vamos dominar a discordância
Entregar os pontos, pois já estamos todos vencidos...
E chapados.

quarta-feira, 3 de novembro de 2010

Regressão

Você diz que já é tarde pra partir
Que já não existe mais conexão entre nós,
Entre o que chamamos de sonho
Separação mútua de sentimentos, beirando a insanidade
Só pra tentar achar algum resquício de respostas
Para as perguntas não feitas
Eles falavam bastante nessa história de matrimônio
Fingiam substituir manias por gestos imprevisíveis
Mas uma inesperada falha era o que ningúem esperava
Algo que deixou todo mundo boquiaberto
Aí, o galo cantou, amigo, e cantou alto
Haja compostura para suportar tamanho despertar sem glória
A máscara não podia cair, por nada
Uma menininha era usada como mensageira
Como se ninguém desconfiasse da trama
Mas toda aquela roda foi feita para difamar
Para disparar injúrias de um arco sem valor
Preocupados eram os que se atingiam sem temer
o fim de semana
Finalmente, o tecido foi se esticando como inglês
introspectivo, friamente calculado
E a verdade foi tecendo sua teia, de um repente de louco a outro
Talvez eu seja psicopata ou esquizofrênico demais
Pra te fazer imaginar tudo nos mínimos detalhes,
Mas o que eu me lembro, é mais ou menos assim: turvo
São falhas, muitas falhas que aparecem, desaparecem
Às vezes vem como um flash
Um clarão em meio à escuridão da passarela
Os ambientes não variam, parecem mesclar-se
Então, eu chamei aquela senhora - que Deus a tenha - como
se fosse um animal
Feito cachorro ou gato
Sabe quando você assovia?
Era como se eu estivesse dando "psiu!"

Quanto mais cedo eu puder me livrar dessas torturas,
melhor
Mas ela era bonita demais, era intensidade.

quinta-feira, 21 de outubro de 2010

Ignomínia/Prazer Perigoso

Do nada, brota o artigo indefinido
Que deriva-se de um substantivo privado, modificado em amor
Geneticamente falando em trejeitos disfarçados por baixo
dessa máscara de poeta, ladrão ou palhaço de circo
Sem pisar em nenhum paralelepípedo que encobre a rua
Nadaria, em algum momento, nesse mar de guerra
De mágoas, entre galhos e trepadeiras machucadas
Ou plantas carnívoras forjadas
Às vezes se referindo a um mamífero grotesco
Ou delicado, chamado confiança
Com a primeira letra em minúsculo
Pra mostrar que talvez valha menos que qualquer coisa
Ou que talvez seja de praxe achar-se importante
Si, dó, mi, formam a lei da palavra psicografada
Codificada com cautela, em vícios ou valores ínfimos
Ou super brilhantes, modificados em amor

Tudo flui na rua da amargura, em cada toco
de cigarro pisado pelo recorrente tormento
Todas as crianças choram
Todos os adultos mais áusteros choram
Toda solidão revertida em sofrimento
Ou, muitas vezes, em substância paliativa ou placebo
Tudo isso a favor da cura de uma dor incessante
Que não tem hora pra chegar, não se tem notícias
de quanto tempo vai durar, muito menos se um dia vai acabar.

sábado, 9 de outubro de 2010

Avidez

Quando eu sinto que já está amanhecendo, é apenas a noite vindo
Quando eu sinto que já está pegando cor, é o começo do empalidecimento
Quando eu sinto que já deu o horário, restam mais duas ou três horas
Quando eu sinto que já vou ganhar alta, é só o começo da minha internação
Quando eu sinto que a maré é baixa, todos os prédios estão debaixo d'água
Quando eu sinto que é norte, é sul
Quando eu sinto sucumbir, a hemorragia está apenas batendo à porta
Quando eu sinto que está chegando alguém, é apenas o vento fazendo alarde
Quando eu sinto que a colheita já passou do ponto, a semente está
apenas começando a se revirar debaixo da terra
Quando eu sinto que já sou eu, sou apenas o meio para chegar a mim
Quando eu sinto que já está tudo acabado, o começo se revela misteriosamente.

segunda-feira, 4 de outubro de 2010

Metamorfose

Setenta mil homens
Todos vagando sozinhos
Em espanto à lei indestrutível
Que se interpõe em seus caminhos
Provocando o desrespeito de toda a nação
Mas com direito de pedir perdão

Setenta mil formigas
Todas trabalhando em prol do seu alimento
e tendo como este, um de seus objetivos
Além de manter a sobrevivência da espécie e procriar

Setenta mil homens
Todos largando seus brinquedos
E substituindo-os por armas fortes
E, enfim, dando cabo uns dos outros
Em prol do único objetivo de si mesmo
Sem nenhuma percepção do que
deve verdadeiramente alcançar
em sua passagem por este mundo

Setenta mil formiguinhas.

quinta-feira, 30 de setembro de 2010

O Figurante

Composição: Lavus e Marcus Avelar (Eu)
Numa tarde de ócio muito produtivo.
Breve mais informações.
_

Eu saio de casa e viro notícia
No outro dia, capa de revista
Tenho outro mundo a me esperar
Mas eu não sei por onde começar

Pela janela nuvem cinza me espera
Já terminei de contar meus passos

Nada do que se vê faz parte da realidade
O silêncio atormenta essa cidade
Tudo toma forma de um jeito tão formal
E a gente já não sabe se vem o carnaval

Andando mais distante
Sedento de coragem
Sofrido caminho, mostrando a cara
Eu vou, eu vou, eu vou

Eu vou daqui pra algum lugar
Não sei se o vento que vem vai me levar
Mas eu vou pra algum lugar
Não sei se algum dia eu vou voltar


Pela janela minha vida me espera
Mas eu não sei por onde começar
Andando mais distante à procura de coragem
Eu vou, eu vou, eu vou.

sexta-feira, 24 de setembro de 2010

O Peregrino

De onde vem esse vento que trás todos
esses buracos e obstáculos da estrada?
O que será esse mau tempo que vem
tonificando a sua sede de chegar logo à linha de chegada?
Na estrada e no berço eterno da vida
Onde toda sorte é bem recebida
Estuda-se em centímetros toda a sua partida
Até o momento em que o destino,
inexorável em seu encalço, põe-se a vagar num espaço
Onde já não existe mais fogo e nem caos

A paz ignora a turbulência do seu organismo
e torna-se mais acentuada
A cada estrebaria e noite passada
Sobrevivendo e se alimentando da única
coisa que o faz caminhar de costas,
com diversos olhos a cada canto do corpo
Sensibilizando-se a cada assovio de vento,
A cada folha seca voando contra seus passos
E a cada uivo de lobo que ecoa por toda a esteira vazia

A noite entrega a partida
A luz demarca a chegada,
E o coração demanda a parada.

domingo, 19 de setembro de 2010

Boemia e Corujão

Eu fico bonito pra caralho em fotos 3x4, morram de inveja!
É que ultimamente eu venho apresentando problemas de
preguicite aguda. Essa semana que se passou me apresentou diversas
possibilidades de ficar a noite toda acordado, me levando a
um sono profundo nas tardes poucas vezes ensolaradas, diga-se
de passagem, deste mês de setembro.
Eu lembro que era uma madrugada de quarta para quinta-feira,
entre 15 e 16 de setembro, e fui me deitar às 04:00hs - o que me
levou a ter uma sequência de faltas nas aulas da manhã do dia 16.
Dormi por 12 horas seguidas. Então, não é preciso fazer muito
esforço para deduzir que acordei às 16:00hs do dia 16, né?
Era uma madrugada de quinta para sexta-feira, entre 16 e 17
de setembro (é assim que a minha mente trabalha). Não dormi.
Fiquei aceso a noite toda em companhia do meu velho, querido
e descolorido violão Tonante, dado a mim de presente por um dos
meus saudosos tios, lá pelos meus 8 e não sei mais quantos anos
de idade. Deste dia fatídico para cá, ganhei o apelido de "boêmio"
aqui em casa. Nessa manhã do dia 17 eu tive aula normal.
Quando o relógio denunciou o horário (07:00hs) da minha partida, me levantei
da cadeira de plástico, deixei meu instrumento de lado - nada melhor
do que passar toda uma madrugada fria (destoante do dia) de setembro
tocando o seu instrumento, incomodando toda uma geração de
trabalhadores que ali residiam, em cima e embaixo - e escamboquei-me
no caminho do colégio, que, graças a uma manifestação divina, é
o meu último ano por ali. Cheguei no meu destino com uma sede de
desprezo tremendo que eu olhava para as pessoas e elas, incrivelmente,
se assemelhavam a zumbis em período escolar. Senti desprezo
por todos, como previsto, por eu ser o único ali - milagrosamente -
que não estava com sono. E então o mal, implacável, veio a mim.
Eu comecei a passar por um processo de falha de memória.
Já não sabia mais o número do meu RG e nem lembrava mais
o endereço da minha própria casa. Mas eu tava com meu violão,
sentado na cadeira de plástico, lembrando dos meus saudosos tios.
Com isso tudo eu aprendi que morcegos foram feitos para madrugar
e bichos-preguiça foram feitos para dormir. Me encaixo voluptuosamente
na rotina do bicho-preguiça.

Minha memória passou por um processo de falha tão incomum
que eu já nem lembro mais do que aconteceu nessa semana que se
passou, só sei que foi mais ou menos assim:
Era uma madrugada de quarta para quinta-feira, entre 15 e 16 de setembro...

segunda-feira, 13 de setembro de 2010

Minha Antiga Casa

Lá no meio de uma ladeira que terminava
na beira do rio, inclinada jazia a tal da qual vos falarei.
Minha antiga casa tinha um quintal semelhante
a uma arena, onde as trepadeiras se digladiavam
procurando um lugar no extenso espaço, à procura
da autonomia roubada pelo pé de manga.
Pé de manga este que eu já citei anteriormente.
Minha antiga casa tinha uma sala decorada com
os velhos quadros da minha mãe, com a velha
vitrola do meu pai, vitrola esta que eu costumava
brincar de Dj quando mais novo.
Minha antiga casa tinha o piso escurecido, era de uma
cerâmica demasiadamente arcaica, cerâmica esta
que não se suja facilmente, daquelas de guerreiro,
que mesmo chegando uma tropa de choque
para confiscar os antigos quadros da minha mãe
ou beber daquela água que saia Deus sabe de onde,
não se sujaria assim tão fácil, não se entregaria.
Minha antiga casa tinha uma distância generosa
entre a sala onde se via tv na altura máxima
e a sala onde se escutava os incansáveis iê iê iê's
dos Beatles na velha vitrola do meu pai.
Minha antiga casa tinha pouca gente cantando
em coro a labuta, o que tinha enfrentado durante o dia.
Minha antiga casa era imune a goteiras, pois ela,
estrategicamente, ficava embaixo de uma outra casa.
Minha antiga casa tinha um porão ao lado do quintal,
cheio de velharias, aos pés da mesma escada que para lá descia.
Minha antiga casa se parecia realmente com um porão,
todo mundo dizia isso. Talvez essa comparação se desse
pela forma como era organizada a fachada da minha antiga casa,
com uma escada descendo direto para a porta que
dava na cozinha, não, na cozinha não, na copa,
como assim era chamada.
Minha antiga casa tinha grades nas janelas,
talvez pelo desgastado fato que circulava
de que nossos pais tivessem medo da gente
tentar suicídio tão novos.
Minha antiga casa tinha de tudo isso e mais um pouco.
Talvez ainda esteja tudo lá, esperando por mais uma
dose daquilo que a mantém viva.

quinta-feira, 2 de setembro de 2010

Incertezas

Você pode rir até sua barriga doer, até sucumbir, e já não querer mais parar.
Você pode chorar até desidratar e seus olhos ficarem tão inchados e límpidos
feito o céu sereno após a tempestade; chorar de rir.
Você pode correr até se cansar e suspender a disparada em busca de puxar
uma certa quantidade de ar pra se recompor e recomeçar a correr.
Você pode parar no sinal e dar um trocado pro moleque dos malabares,
mesmo de má vontade, mas você pode.
Você pode sair na chuva e se banhar sem usar sabonete, ou com sabonete,
tanto faz, na incerteza do resfriado de depois.
Você pode tentar cantar com voz de veludo uma canção de ninar e
dormir ao som do seu canto.
Você pode ir de escada quando há a opção do elevador.
Você pode acordar de mau humor e dar um bom dia pra qualquer um que for.
Você pode se atrasar e levantar a cabeça aos olhos de quem te condena, você pode.
_

Você pode ir pro bar e beber tanto a ponto de trocar o 2 pelo 18.
Você pode pisar a grama quando lá reside a plaquinha alertando o contrário.
Você pode atravessar a rua na pressa, correndo, sem olhar pros lados, sem se preocupar.
Você pode chegar de repente e atacar todo mundo; fugir de casa.
Você pode chutar a porta do mundo e mergulhar de cabeça.
Você pode bater numa velha de bengala até ela não sentir mais dor, só pena.
Você pode sofrer com a saudade e continuar se afastando até rasgar o peito,
no sadomasoquismo.
Você pode dormir tarde e acordar cedo, no sadomasoquismo.
Você pode pular o muro cheio de pregos da prisão que lhe cerca; se drogar.
Você pode ser a caça hoje, amanhã o caçador.
Você pode ir num puteiro em busca do prazer pelo dinheiro,
mas você pode também amar.
Você pode irritar e ser irritado.
Você pode chegar de surpresa sem causar espanto, sendo previsível.
Você pode assustar uma criancinha, com uma máscara do
Freddy Krueger, até ela chorar.
Você pode morrer jovem, até se matar.
Você pode ser enganado e sentir prazer ao enganar.
Você pode assaltar um ônibus, fazer doze reféns e se dar
bem, levar fama por isso. Mas você pode se dar mal também.
Você pode não fazer nada disso, não ter desfecho, ter medo de encerrar,
mas tudo você pode.

terça-feira, 17 de agosto de 2010

Saudosismo


De uns tempos pra cá eu venho me perguntando porquê que os bons tempos e as boas épocas passam tão depressa. Em seguida eu começo a repassar, descobrindo que deixei corações naquele canto por onde passei; que as risadas foram tão boas que até já esqueci as piadas. Aquilo é que era tempo de ouro: a gente aprendia com a infância, tirava proveito inocente dos amigos na hora de brincar com seus brinquedos e vídeo-games ultra modernos, coisa de última geração mesmo.
Um cachorro dócil, triste às vezes e solitário, me vem à memória, me fazendo lembrar que viveu parte do seu filhotismo num cubículo enorme que eu tinha orgulho de chamar de "meu quarto". Mas eu não dormia lá. Eu dormia com a minha mãe no aconchego de sua cama, debaixo do mosquiteiro verde que meu pai armava toda noite antes de ir dormir. A partir de um certo tempo ele passou essa obrigação pra mim, quando eu aprendi a desligar a panela do leite antes d'ele derramar. Mas voltando ao cachorro... ele cresceu, claro, e foi logo transferido para o enorme quintal de um lugar onde eu cumpri minha infância até a minha aborrecência ainda recorrente, onde tem um pé de manga que dá bons frutos sempre a seu tempo. O cachorro morreu. Eu recebi essa notícia como uma panelada na cara e chorei, chorei debaixo do chuveiro onde minhas lágrimas se misturavam com a água que descia pelo ralo. Uns tempos depois percebi que a vida segue e começa a ficar tão boa quanto deveria ser. Você começa a se sentir livre, mesmo que tenha alguém que não esteja gostando nada dessa história.
A mesma malandragem de criança, de quando costumávamos pedir dinheiro para a vizinha (mulher do velho da brasília branca), - que Deus os tenha - continua nos acompanhando sempre, a cada dia, a cada ano, a cada Copa do Mundo onde se ouvia os gritos de alegria e os fogos de São João a se desfazerem no ar e se transformarem em sons excitantes; onde se vislumbrava aquela velha e buliçosa rua sendo enfeitada com bandeirolas e suas calçadas sendo pintadas de verde e amarelo, verde e amarelo.
Alguns detalhes passaram bem escondidos (ou não passaram), resumidos na pressa de quem corre a alcançar a linha de chegada, na pressa de quem fecha o olho e deseja logo o sono instantâneo. Até que tudo isso passou, e passou bem. E aqueles lindos momentos memoráveis nos quais éramos felizes e sabíamos muito bem, ficaram guardados para sempre e finalmente podemos dizer com firmeza: minha infância foi foda! Daria um filme envolvendo todas as nuances dos mais variados sentimentos e sendo reproduzido em película cinematográfica, num estilo característico de quem viveu pra valer e com vontade.

Desabrocho

Deixa derramar o sangue
que jorre o sangue
do mar de grama
onde todo fruto é amor
do sal e da lama
onde toda serra em par
é paisagem texana

Deleite e reza braba
onde nenhum fogo vai queimar
dirijo sem vida
o meu cachecol de pano
em cereja plantada
em canavial de prata
quem vê a solidão te encarando
tem dois pássaros voando a te açoitar

Que jorre o sangue
em céu distante
feito um mangue
em azul escarlate
que alguém há de amar-te
a solidão exclama e ainda te encara
deitada ao pé do servo
como um covil em chamas
te parte e te abate

Ah, mulher insistente... coração valente
nem que a letargia secular
não se canse de correr
na velocidade da luz
recomeçando em andar
a passos de bebê
no sol da tarde
cada raio é um espasmo
de vida em roda de ciranda
cantando: hoje eu te dou bom dia.

sexta-feira, 13 de agosto de 2010

Noite Em Claro

Aí você rebece uma notícia e descobre algo pra te agitar
Algo baseado naquilo que você gosta
Se tiver espaço para se expressar de todas as formas
Vai chamar seus poucos e grandes amigos
Passeando entre estreitos e longos passeios e calçadas
é que se chega ao ponto mais próximo da sua alma
Gole vai, gole vem, ao seu redor tudo se torna amigável
Todos se tornam amigáveis
E então, começa a se sentir querido, notado
Detonando ao reverbe da música numa
junção de todos os instrumentos
O vazio começa aos poucos a dar lugar
a uma incrível solidez, que, mais tarde,
irá se transformar em lembranças
legais - ou não - de se lembrar

_

Aí você acorda nostálgico
Tentando ainda perceber se já caiu a ficha
E descobre que não
Descobre que sobraram boas recordações,
turvas, mas boas
E começa a se questionar se tudo aquilo
realmente aconteceu ou se foi apenas um sonho bom
Se é difícil conviver sozinho com todas essas reminiscências
Necessitando e achando que algo te falta
Mas não falta nada
É só o seu organismo reclamando do exagero
Todas aquelas pessoas
Ricas criaturas alegres
Ainda permanecerão guardadas por um bom e longo tempo
Mesmo que a morte os separe.

quinta-feira, 5 de agosto de 2010

Tudo aqui tá desafasado
Tá tudo defasado aqui
Defasou tudo
Defasado não estaria se não estivesse defasado
Tá defasado porque defasou
Tudo aqui tá defasado
Tá tudo defasado aqui.

segunda-feira, 2 de agosto de 2010

Circo e a Selva

Eu não sei mais de mim
Amenizei a temperatura do ambiente
A água agora desce quente
Já não é mais a mesma de antes

Os sapatos não fazem mais ranger
O gelo não faz mais queimar
Ninguém foi ver o mar
Só o rio que secou
Só o rio que secou

Oh, fonte que não fornece mais
Uma juventude animadora
Como aquela outra
De antigamente, feliz, contente
Amor barato, pétala de flor

Nenhum som tão baixo
Que não seja audivelmente claro
Por seus ouvidos, num circo
Onde palhaços gargalhando
Cheio de feras a rosnar
E cheiro de pipoca salgada

Sentado num banco
Livre, dizendo uma dose de felicidade
Carente de pranto
Formou-se um rumo
No qual palhaços gargalhando
Cheio de feras a rosnar
E cheiro de pipoca salgada no ar.

domingo, 1 de agosto de 2010

Aos Patos

Quem nunca passou
Na praça dos patos, quem?
Quem nunca parou
para olhar os patos, quem?
Quem nunca pensou
Em alimentar os patos, quem?

Se tu soubesse, bicho
Da tua nobre presença
Doce embriaguez
Que me dá na crença
De que ainda vai voltar
Pro teu lugar

Eu, nordestino, escrevo
Por versos baianos
Eterno a te adorar
No teu mais glorioso andar
Em todas as horas
Em qualquer lugar
Seja na praça ou no campo
Se banhando ou apenas olhando
O mundo encantado e te encarar.

terça-feira, 20 de julho de 2010

Algumas Repostas Para Uma Simples Pergunta

Certo dia de manhã nublada, numa singela cidade, se encontrava ele: o senhor instrospectivo. Cansado de tudo e de todos, decidiu fugir para dentro de si, logo ali, sentado na ponta de um passeio da rua Milagres. Ele tinha coragem, vestia um enorme sorriso mudo para o nada e se mantinha ali, sentado.
Um velho sujeito de barba que passava por ali, ao avistar o outro, se aproximou e perguntou: "Olá ! O que fazes sentado aí ?". O outro ergueu a cabeça lentamente com um olhar cansado, e foi lhe respondendo: "Aqui, eu penso sobre a vida. Aqui, eu penso sobre o amor. Dou asas às feridas, elas se vão e se misturam com o vento malandro, que carrega pra bem longe, me livra da dor e faz-me esquecê-las temporariamente. O tempo é amigo da indagação e inimigo da pressa. Se tem pressa, é melhor correr, porque o tempo não espera, amigo. Aqui, eu junto para mim todas as lembranças bem vividas, todas as felicitações recebidas, todos os amigos inesquecíveis, imortalizados com o passar dos séculos.
Todos os caminhos percorridos ? qual deles aponta para o fim ? qual deles aponta para a boa sorte ? eu vou pegar o caminho mais saudosista, companheiro. Quero descobrir se ele me leva a um final animador. Só sei que cada passo é como engatinhar: doloroso... devagar. Poucos se lembram disso depois. Só os que provaram em cada bebedouro é que podem se orgulhar. Então, eu levanto a minha humilde e desgastada consciência e vou ao encontro do que me espera por aí. Só fico atento para que não haja um pote de ouro, como muitos dizem. Quanto à você, pode se sentar. Espero que saiba o que responder para o próximo que passar."
E sendo assim, o senhor se levantou, começou a andar vagarosamente e logo desapareceu ao longe no horizonte.

segunda-feira, 19 de julho de 2010

O Inofensivo Sujeito Sem Terno

Não havia fome, não havia miséria. Era tudo alternativo. Era proibido se prostituir. Representava algo ou alguém superior, mas não era tão bem visto assim. Falsas acusações. Imagem do bem, bem vestida. Só o tempo sabia a verdade. Taxado de louco e baderneiro, foi levado a uma espécie de forca. Ficou tudo vermelho então, deixou de existir. A maldade dos nossos tempos de tentativas falhas de estabilização, era tamanha, que, nenhuma melodia tinha seu lugar e todo pavil aceso era motivo de apreensão. Era assim. Às pressas, cada um deixou seu quinhão. Escuro ficou o lugar, então, a história veio investigar. Morte por valentia. Ninguém mais vivia, nenhuma alma sorria, nenhum coração palpitava. E assim, veio uma nova multidão enérgica.

domingo, 18 de julho de 2010

Domingo

Eu não sei te definir
eu não sei me definir
eu não sei se vou fingir
ou se estarei a sorrir

Eu não sei se estou no chão
ou perto da multidão
ou se levanto e saio
quem daria atenção ?

Eu não usei meu charme
eu não tirei sua razão
nem quis te demitir da solidão
apenas reservei meu lugar no rio

Me afogarei no rio
beberei água do rio
sobreviverei do rio
me encerrarei no rio.

sexta-feira, 16 de julho de 2010

Então Tenha Calma

A vida é curta, amigos

os pássaros voam e a noite cai

como você vai e o corpo fica

caído no chão, suspenso no ar

escuro na imensidão

claro feito um lampião

deserto feito um curral

na hora do acerto do fim do dia

oh, caminhos envenenados

oh, caminhos curtos

oh, caminhos confusos

mantenha a calma em sua direção

distraia o vento do furacão

alimente-se em cada ninho

pois tão implacável és o teu caminho.

quinta-feira, 15 de julho de 2010

Momento Constante

A questão do "cale-se!" não se vê por ali. Acorda todo dia e é sempre a mesma solução enganada, o mesmo caminho. O destino do seu dia se encontra forçadamente trancado. Enquanto os outros explodem, ele é obcecado pelo silêncio. É demasiadamente tácito. Pouco se envolve por vontade própria, só espera ser notado. Aí é que se explode. Não há mais caminho depois, nem divisão. O bolso cheio de mágoas, de repente, vai ficando vazio... conteúdo espalhado pelo chão. Chega ao fim do sol com o coração apertado. É outro dia. Sempre igual, só um pouco mais complicado.

quarta-feira, 30 de junho de 2010

Três Coisas.

“As três coisas mais importantes da minha vida” é uma questão de momento: hoje pode ser que tenha algo definido, amanhã pode se tornar vento. Sentindo a necessidade de me explicar, eu posso dizer hoje que essas são as três coisas mais importantes da minha vida: meus familiares, minha saúde e minha cama.

As pessoas que vivem ao meu redor são movidas por pensamentos quase sempre decisivos, e mal sabe elas qual é resolução da minha existência. Vou confessar que nem eu sei ao certo. Meus familiares formam um vínculo tão importante pra mim, nessa vida, que sem eles eu não poderia me dar ao luxo de existir. Essas pessoas tão singulares, ímpares, é que me fazem seguir em frente, me dando motivações e atenções, dilemas e reflexões, problemas e soluções. A minha saúde me deixa inteiro, sem ela, eu não estaria dentro dos padrões de existência que a vida requer. Eu pulo e dou “vivas” por ter saúde, disposição e preguiça suficientes pra se viver em paz. Digo que posso viver em mim hoje mais do que ontem. Eu posso viver no mundo, pois estou cheio de saúde, repleto de esperança de que ela nunca se acabe. A minha cama me proporciona sonhos, é uma cama única, pois ninguém sente nela o que eu sinto ao me deitar.

Por fim, espero eu com meus botões, que essas três coisas continuem contribuindo comigo pelo resto da minha vida, me dando razão pra existir, força pra me manter em pé e um leito pra eu me deitar e por em organização inconsciente todas as reflexões e sonhos mais profundos.